Marcadores

sábado, 25 de fevereiro de 2012

Retiro.IV. Um Deus que desconcerta




Dom Henrique

Retomemos o texto de Ex 15. É uma perícope tremenda!

“Em seguida, Moisés e Aarão apresentaram-se ao Faraó e lhe disseram: ‘Assim diz o Senhor Deus
de Israel: Deixa partir o meu povo, para que me celebre uma festa no deserto’. Mas o Faraó respondeu: ‘E quem é o Senhor para que lhe deva obedecer, deixando Israel ir? Não conheço o Senhor, nem deixarei Israel partir’. Eles disseram: ‘O Deus dos hebreus marcou um encontro conosco. Deixa-nos ir a três dias de viagem no deserto, para oferecermos sacrifícios ao Senhor nosso Deus. Do contrário, a peste e a espada nos atingirão’. Mas o rei do Egito lhes disse: ‘Por que vós, Moisés e Aarão, levais o povo a transcurar os trabalhos? Ide para vossas tarefas!’ E o Faraó acrescentou: ‘Eles já são mais numerosos que a população local, e vós quereis fazê-los interromper suas tarefas?’ Naquele mesmo dia o Faraó ordenou aos inspetores do povo e aos capatazes, dizendo: ‘Não forneçais mais palha a esta gente para fazer tijolos, como antes fazíeis. Que eles mesmos busquem a palha. Mas exigi a mesma quantia de tijolos de costume, sem tirar
nada. São uns preguiçosos, e por isso reclamam: ‘Queremos ir oferecer sacrifícios ao nosso Deus’. Carregai estes homens com mais trabalho, para que estejam ocupados e não dêem ouvidos a palavras mentirosas’.

Os inspetores e os capatazes foram, pois, dizer ao povo: ‘Assim diz o Faraó: Não vos darei mais
a palha. Devereis ir buscar a palha onde a puderdes encontrar. Em nada, porém, será diminuída a vossa tarefa’. O povo dispersou-se por todo o Egito em busca de palha. Mas os inspetores pressionavam-nos dizendo: ‘Terminai a tarefa marcada para cada dia, como quando havia palha’. Castigaram os capatazes israelitas que os inspetores do Faraó haviam nomeado, alegando: ‘Por que nem ontem, nem hoje, completastes a quota costumeira de tijolos?’

Os capatazes israelitas foram queixar-se com o Faraó, dizendo: ‘Como podes proceder assim com
teus servos? Não se fornece palha a teus servos, e nos mandam fazer tijolos. Nós somos açoitados, mas o culpado é o teu povo’. O Faraó respondeu: ‘Sois mesmo uns preguiçosos e por isso dizeis: ‘Queremos ir oferecer sacrifícios ao Senhor’. E agora, ide trabalhar! Não vos será dada a palha, mas devereis produzir a mesma quantia de tijolos’.

Os capatazes israelitas se viram em má situação com a ordem de não diminuir em nada a quota
diária de tijolos. Encontraram-se com Moisés e Aarão, que os estavam esperando na saída do palácio do Faraó, e lhes disseram: ‘Que o Senhor vos examine e julgue: vós nos tornastes odiosos diante do Faraó e dos seus servidores e lhes pusestes na mão a espada para nos matar’. Então Moisés voltou-se para o Senhor , dizendo: ‘Meu Senhor, por que maltratas este povo? Para que foi que me enviaste? Desde que fui ter com o Faraó para lhe falar em teu nome, ele maltrata o povo, e tu nada fazes para libertá-lo’” (Ex 5).

Recordemos que foi contra a vontade do próprio Moisés que Deus o enviou ao faraó. Vale a pena
recordar em Ex 3 o penoso diálogo de Moisés com Deus. O Senhor força o pobre homem; Moisés tenta escapar dando mil justificativas. E Deus termina por irar-se com ele! Moisés, por fim, encurralado pelo Senhor, cede! E Deus previne que a tarefa não será fácil: “Bem sei que o rei do Egito não vos deixará partir, se não for obrigado por mão poderosa. Mas eu estenderei minha mão e castigarei o Egito com toda sorte de prodígios que farei no meio deles. Depois disso, vos mandará sair” (Ex 3,19-20). Pois bem, Moisés obedece e vai; arrisca a própria vida a apresenta-se ao faraó. E o resultado é uma catástrofe: o rei do Egito não somente não deixa o povo partir, como piora a situação, aumentando a carga de trabalho e o peso da escravidão... É de se perguntar: Onde está Deus? Por que age assim? Por que permite a dor e o sofrimento? Por que seus caminhos nos são tão incompreensíveis?

E, pior ainda: os próprios filhos de Israel ficam indignados contra Moisés e Aarão: “Que o Senhor vos examine e julgue: vós nos tornastes odiosos diante do Faraó e dos seus servidores e lhes pusestes na mão a espada para nos matar”. Imagine a solidão, a angústia, o sentimento de frustração de Moisés! Ter-se-ia enganado? Será que fora ilusão aquele chamado de Deus? Será que Deus é mesmo poderoso? Será que é fiel e se pode realmente confiar nEle? Perguntas de Moisés... Perguntas tão nossas em tantas circunstâncias da vida... Moisés desabafa, com palavras de cortar o coração: “Meu Senhor, por que maltratas este povo? Para que foi que me enviaste? Desde que fui ter com o Faraó para lhe falar em teu nome, ele maltrata o povo, e tu nada fazes para libertá-lo!”Sobre estas palavras vale a pena notar duas coisas:
(1) Moisés não compreende as razões do Senhor; sente-se decepcionado, quase que traído por Aquele que o obrigou a abraçar missão tão difícil e tão sem chance de sucesso... E, no entanto, não desobedece, não se revolta...
(2) Moisés reza! Sua queixa não é murmuração, não é reclamar de si para consigo, mas é um suspiro, um gemido, uma angústia derramada diante de Deus! Isto deveríamos aprender: a nunca murmurar, nunca falar de nós para nós, mas apresentar ao Senhor o nosso clamor! Rezar a alegria e a tristeza, a dor e a esperança, rezar nos momentos de luz e de profunda escuridão... Rezar sempre! Só assim perceberemos Deus em todas as situações de nossa vida, ainda que não compreendamos o agir desse Deus Santo demais, Outro demais, Misterioso demais! Como se compreende Deus? Calando o coração, dobrando o joelho, baixando a cabeça, abandonando-se...

Para refletir e rezar:

= Que missão o Senhor me confiou neste mundo? Que apelos me faz?

= Tenho tido a coragem da fé, saindo de mim e de meus planos para abraçar o plano do Senhor
para mim? Sei dizer como Santa Teresa de Jesus: “Vossa sou, para vós nasci. Que quereis fazer de mim?”

= Nos momentos de escuridão, de incerteza, de sentimento doloroso da ausência de Deus, como reajo: rezo e espero, mais que o vigia pela aurora ou, ao invés, rebelo-me e penso: “Deus não existe”?

= Sei abandonar-me nas mãos do Senhor? Que limites, que condições tenho colocado para minha fé em Deus? Lembremo-nos: Deus nos quer por inteiro, com uma confiança absoluta nEle! Só esta atitude nos tira de nós mesmos e nos liberta! Pense nisto!

Nenhum comentário:

Postar um comentário